sábado, 31 de agosto de 2013

Os protestos urbanos no Brasil e em Roraima

Os protestos que começaram em junho movimentaram milhares de pessoas em todo o Brasil, e provocou mudanças notáveis na economia e política do país

Mais de um milhão de pessoas foram às ruas em junho
As manifestações que movimentaram o Brasil a partir do mês de junho mudaram a questão do comodismo e conformismo de nosso país. Os políticos representantes do povo começaram a temer os gritos de mudança da sociedade brasileira. Os que se calavam ganharam voz, mesmo que tenham sido covardemente atacados por policiais, e engolidos pela mídia.

Inicialmente, a partir do dia 2 de junho, os movimentos se concentraram em São Paulo, onde protestavam contra o aumento da passagem do transporte coletivo. A ampla maioria dos manifestantes eram jovens estudantes. Nos dias seguintes, outras capitais como Natal, Porto Alegre, Teresina, Maceió e Rio de Janeiro se uniram aos manifestos populares.

As passeatas ganharam mais força durante a Copa das Confederações. Na estreia do evento, a presidente Dilma Rousseff ao lado do presidente da FIFA Joseph Blatter, enquanto lia o discurso de abertura, foi vaiada diante de milhares de torcedores no jogo entre Brasil e Japão, no estádio Mané Garrincha em Brasília.

No dia 17 de junho, cerca de 300 mil pessoas se mobilizaram em 12 cidades brasileiras. O maior número de pessoas foi registrado na cidade do Rio de Janeiro, cerca de 100 mil, segundo a Polícia Militar. Outro destaque do dia foi a ocupação de pessoas no Palácio da Alvorada em Brasília, o que lembrou a cena de 1984, onde uma multidão ocupou o local, reivindicando eleições diretas para presidente.

A questão do preço da passagem do transporte coletivo começou a perder o foco a partir do dia 19, quando Rio e São Paulo reduziram a tarifa, e depois outras cidades anunciaram a redução do preço. Foram colocados em pauta nos protestos em 120 cidades, os gastos da Copa das Confederações e da Copa do Mundo, o combate à corrupção, educação e saúde precárias, a “cura gay”, a PEC 37, entre outros temas.

Os protestos logo tiveram efeitos. A Câmara Federal derrubou por 430 votos a 9, a PEC 37 – projeto que tirava do Ministério Público o poder de investigar. Foi aprovado no Congresso o projeto que torna a corrupção como crime hediondo. Na Câmara, foi aprovado o projeto que destina os royaltes do petróleo em 75% para a educação e 25% para a saúde. Em 2 de julho, a “cura gay” foi tirada de pauta pelo presidente da Câmara, Henrique Alves.

BOA VISTA – A capital de Roraima se uniu às causas nacionais no dia 18 de junho (terça-feira). Milhares de pessoas se reuniram no centro da cidade, até o dia 22 (sábado) para protestar contra a corrupção, a falta de infraestrutura na saúde e educação, e contra o poderio político do governador do Estado José de Anchieta e família Jucá. O último dia de passeata, no sábado, onde o tema central era a rejeição da PEC 37, foi registrado o maior número de pessoas, cerca de 3 mil, segundo a Polícia Militar (PM). Durante alguns manifestos, a PM precisou jogar bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo para intimidar uma minoria de baderneiros.


As manifestações de Boa Vista na visão dos partidos políticos

Os protestos na capital roraimense são apoiados por partidos como o PMDB e PDT

Fotos de Lucas Luckezie e Felipe Medeiros durante os protestos em Boa Vista

As manifestações feitas de forma pacífica são legítimas. A Constituição Federal Brasileira em vigor desde 1988 prevê em seu artigo 220 que é livre a manifestação de pensamento e expressão. Os líderes locais do PMDB, partido que comanda Boa Vista, e do PDT, que luta nas últimas eleições por um cargo majoritário, no âmbito estadual e municipal relatam seus posicionamentos a respeito das manifestações em Boa Vista.

A reportagem enviou perguntas via e-mail para o presidente do Partido do Movimento Democrático Brasileiro em Roraima (PMDB-RR), e vice-presidente da sigla nacional, o senador Romero Jucá que está em Brasília. A assessoria entrevistou o senador com os questionamentos, e gravou um material em áudio, especialmente para esta matéria.

Na gravação, o presidente do PMDB no Estado destacou a visão do partido sobre as manifestações. “Nós entendemos que as manifestações são legítimas. Elas demonstram um somatório de reivindicações de insatisfações, de questões relevantes do ponto de vista social, econômico e moral, ético e político, as quais precisam de respostas, com ações concretas por parte dos poderes institucionais e da própria sociedade”.

Foto: Senador Romero Jucá (PMDB-RR)
Jucá entende que “as manifestações desencadearam um maior processo de participação da população, principalmente dos jovens, e é algo extremamente legítimo, uma mudança dos paradigmas da questão política e na relação da sociedade com a própria questão política. São manifestações positivas que vêm melhorar o quadro político e social”, comentou.

Durante as manifestações de Boa Vista, o Blog do Lucas Luckezie entrevistou alguns manifestantes que afirmavam que os políticos se esconderam, pois temiam a pressão popular, sobretudo, o vandalismo praticado pelos pequenos grupos de vândalos.

De acordo com este pensamento, o senador relata que os políticos do PMDB não se sentiram de forma alguma pressionados ou hostilizados. “De forma nenhuma fomos hostilizados. Eu acho que nós que estamos na vida pública, temos que estar preparados para a cobrança, para as críticas, e a ação politica é exatamente de representação, de debate e embates, e principalmente de respeito à manifestação da população”, declarou.

A violência não legitima a revolta da população por melhorias na política, como lembra Jucá, que também defendeu os manifestantes, que em maioria estavam nas passeatas de forma pacífica. “É claro que durante as manifestações existiram vandalismos e excessos, mas esses excessos não podem ser apoiados e nem utilizados como forma de inibir ou desqualificar a maioria da população, a grande maioria que estava presente reivindicando, protestando, e exercendo seu direito legítimo de se manifestar”, enfatizou.

O senador destaca os resultados dos protestos. “Eu acho que o Governo Federal entendeu o recado das ruas, a própria presidenta Dilma já remodelou algumas ações e posturas do Governo, o Congresso Nacional fez seu esforço concentrado, votou matérias, e arquivou outras como a PEC 37. Eu acho que os partidos políticos entenderam que o importante é ampliar o escopo de participação, os próprios segmentos organizados viram que tem que se organizar e tem que colocar adequadamente os pleitos, que nós tivemos fatos positivos e concretos, frutos das manifestações”, destacou Jucá que não se limitou a falar sobre os efeitos dos protestos em Boa Vista.

Telmário Mota. Foto: Divulgação / Facebook
Já o presidente do Partido Democrático Trabalhista em Roraima (PDT), Telmário Mota, diz que o partido nasceu de protestos populares. Ele relata a visão que a sigla teve ao ver a juventude ir às ruas protestar. “O PDT fica muito feliz em ver a juventude ir pra rua, esse movimento é à nível nacional, embora a participação não seja maciça, mas foi como carro-chefe puxado pela juventude”, relatou.

O partido apoia as manifestações, e se centra nos ideais do seu fundador Leonel Brizola, que valorizava o apelo popular, como lembra o presidente da sigla no Estado. “Brizola dizia uma coisa interessante, mesmo que você esteja fazendo parte de um governo, mas que esse não atende a sociedade popular, largue o governo e vá com o povo. Esse é o nosso pensamento, o nosso sentimento. Se as pessoas foram às ruas e gritaram alguma coisa, o PDT tem a obrigação de estar do lado delas”, declarou.

Como o partido nasceu de manifestações populares, cria-se a ideia de que tenha se infiltrado nas passeatas. Durante os protestos, os organizadores barraram pessoas ligadas a partidos políticos, os quais consideraram estas como oportunistas. Mota nega que tenha se infiltrado nos manifestos. Ele apenas afirmou que chegou a convocar a sociedade boa-vistense a ir às ruas.

O presidente regional do PDT convocou os jovens filiados, não para levantar a bandeira do partido, mas para reivindicar por melhorias dos serviços públicos no Estado, os quais estavam sendo deixado de lado pelos manifestantes – maioria jovens - que protestavam contra mazelas nacionais como a PEC 37, e não locais.

“Roraima hoje vive várias dores e necessidades, e ir pra rua só gritar contra a PEC 37 era muito pouco. O PDT não foi, mas eu aproveitei, como tive 30 mil votos [nas eleições de 2012 para prefeitura da cidade], como hoje nós temos pessoas que vê na gente uma liderança, eu fui num carro de som chamar as pessoas para se unirem a esse movimento, mas eu não fui. Eu deixei que o movimento fosse popular, mas eu fiz na rua o chamamento, que como líder político com credibilidade, como homem que tem o voto popular, eu queria que as pessoas fossem para que o movimento ‘tivesse corpo e músculo’”, declarou.

RESULTADOS
Em Roraima - Conforme publicado na imprensa local e pelo site oficial do deputado estadual Chico Guerra, uma audiência pública realizada na Assembleia Legislativa do Estado de Roraima (ALE-RR) no último dia 22 de agosto discutiu melhorias na educação e saúde do Estado. A pauta de reivindicações foi discutida entre a Comissão de Educação e Saúde da ALE-RR, líderes de movimentos sociais, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dos Ministérios Público Federal e Estadual, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Universidade Estadual de Roraima (UERR), Sindicato dos Trabalhos em Educação de Roraima (SINTER), Conselho Regional de Medicina (CRM), além de parlamentares e sociedade civil.

O presidente da ALE-RR, deputado Chico Guerra enfatizou na audiência que os representantes do Legislativo estão cada vez mais ouvindo os apelos populares da sociedade e “dando oportunidade a todos de reivindicarem seus direitos legítimos. Os movimentos sociais aqui representados devem continuar na luta por dias melhores, não fazendo parte de classes partidárias e sim, representando as necessidades de toda uma população”.

Um breve resumo da atual situação da saúde e educação do Estado foi levantado pelos líderes de instituições que participaram da audiência. Todos os relatos ouvidos no encontro serão transcritos numa carta que será enviada ao Poder Executivo do Estado e aos órgãos fiscalizadores.

A Comissão de Educação e Saúde da ALE-RR já está articulando ao Governo de Roraima melhorias na saúde e educação. No debate, o presidente da Comissão, deputado Joaquim Ruiz (PV), afirma que ““Não se faz educação e saúde no estalar dos dedos, é preciso orçamento para isto. O Estado trabalha com o orçamento que tem, mas não deixamos de dialogar com as categorias. Recebemos hoje (22 de agosto) na ALE o projeto que discute o Plano de Cargos e salários da UERR para juntos encontrarmos bom senso. Estamos em pleno debate sobre os principais assuntos que afligem nossa sociedade”.

Na tribuna, os representantes dos órgãos fiscalizadores do Estado e União contribuíram com os debates, apontando as falhas no sistema educacional e de saúde e mostraram também as ações existentes em cada órgão em relação aos impasses apresentados pelos movimentos sociais.

Em Boa Vista - Em entrevista à Folha de Boa Vista, em julho, os líderes do movimento “Vem Pra Rua” - um dos grupos que organizou as passeatas na capital – afirmaram que os poderes Executivo e Legislativo Municipal não mostraram posicionamento quanto aos questionamentos.

O grupo apresentou as reivindicações ao vice-prefeito Marcelo Moreira, e ao presidente da Câmara Municipal, vereador Léo Rodrigues, mas ambos disseram que não poderiam atender aos apelos.

Temas como educação, saúde, segurança, transporte público e lazer foram alguns pontos da pauta. Os líderes destacaram no documento, a urgência na solução de problemas como o funcionamento dos restaurantes populares e a restauração das 46 praças que se encontram em péssimas condições na capital.

É por conta do jogo de interesses individuais, que as manifestações não deram certo”, diz a socióloga Alessandra Rufino sobre os protestos em Boa Vista

A socióloga e professora universitária Alessandra Rufino acredita que as manifestações não obtiveram os resultados concretos por haver um jogo de interesses individuais. “O problema dos manifestos é questão dos interesses. Cada um de nós tem interesses individuais. Nós podemos ser a maioria, não estamos à frente do poder, mas podemos ser a maioria, porém, esses interesses próprios é que estragam tudo”.

Rufino acredita que a população deve ter a visão de lutar por interesses coletivos, como o combate a corrupção, e que faltou organização nas passeatas. “Quando nós pensarmos como uma maioria, o que é muito difícil, quem sabe? Porque é por esses jogos de interesses individuais, que a meu ver, as manifestações não deram certo. Havia grupos que queriam protestar só pela saúde, outros, só pela educação. Vamos pensar de forma coletiva e ir às ruas com um único direcionamento, que a priori, deveria ser contra a corrupção. Faltou isso, uma organização”.

O presidente do PDT-RR, Telmário Mota, concorda que não houve uma organização adequada dos protestos em Boa Vista, e que diante disso, movimentou a juventude de seu partido a levar a mensagem socialista às ruas. “Como percebemos que as manifestações em Boa Vista não tinham uma organização adequada, ela acabou não deixando uma mensagem. Eu que fui do grupo jovem e estudantil, fui universitário, trabalhei muito quando me formei, então eu orientei a Juventude Socialista que fosse às ruas, mas que fossem com uma mensagem”. A orientação de Mota foi de que o grupo deveria reivindicar melhorias a âmbito local, já que questões nacionais como a PEC 37 estavam em pauta nas passeatas na capital.

Por Deborah de Negreiros, Laura Bentes e Lucas Luckezie.
 

2 comentários:

  1. adorei a reportagem! ficou maravilhosa!
    Deborah

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  2. Nossa reportagem ficou ótima... e o Blog ainda levou um crédito hahaha bjs

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